quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Elementar

Embora ame a ventania de antes da chuva, andando contra muito vento eu não respiro direito. Nem só pela concentração que é exigida do corpo, que precisa impor seus 52kg de ossos, carnes, anseios e frustrações contra as forças arrebatadoras da natureza e parece sempre que não vai conseguir, demorado como esta frase, mas também pelo excesso de informação e estímulo em toda parte da derme que, penso, deve causar algum bloqueio às minhas narinas. Só lembrar da circunstância já me faz faltar o fôlego. O elemento ar transita ligeiro e com tanta violência nas esquinas do mundo nessas ocasiões que, posso imaginar, por isso mesmo não encontra o caminho das minhas vias aéreas.
Que sensação confusa quando o excesso de quem me traz vida também é capaz de me sufocar.

Dizem sempre, sobre o risco de despressurização e a falta de ar: ponha primeiro a sua máscara e depois se preocupe com o passageiro ao seu lado. Que bom que nos ensinam todo voo sobre a dose necessária de egoísmo para a sobrevivência. Só esqueceram de nos contar que, num desastre aéreo, apenas se pode salvar alguém da falta de oxigênio, jamais de uma insuficiência respiratória voluntária.

É importante saber por a máscara. O elementar é querer respirar.
O atrito de um corpo contra o vento torna a respiração muito mais difícil.
O atrito do ideal contra a vontade torna a sobrevivência de qualquer amor impossível.

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